quarta-feira, 18 de novembro de 2020

Tempo para a poesia LXV

Poemas ditos por Aurelino Costa e musicados por Victorino D'Almeida

Vasco da Gama

Somo nós que fazemos o destino.
Chegar à Índia ou não
É um íntimo desígnio da vontade.
Os fados a favor
E a desfavor,
São argumentos da posteridade.

O próprio génio pode estar ausente
Da façanha.
Basta que nos momentos de terror,
Persistente,
O ânimo enfrente
A fúria de qualquer Adamastor.

O renome é o salário do triunfo.
O que é preciso, pois, é triunfar.
Nunca meia viagem consentida!
Nunca meia medida
Do vinho que nos há-de embriagar!

Não passarão

Não desesperes, Mãe!
O último triunfo é interdito
Aos heróis que o não são.
Lembra-te do teu grito:
Não passarão!

Não passarão!
Só mesmo se parasse o coração
Que te bate no peito.
Só mesmo se pudesse haver sentido
Entre o sangue vertido
E o sonho desfeito.

Só mesmo se a raiz bebesse o lodo
De traição e de crime.
Só mesmo se não fosse o mundo todo
Que na tua tragédia se redime.

Não passarão!
Arde a seara, mas dum simples grão
Nasce o trigal de novo.
Morrem filhos e filhas da nação,
Não morre um povo!

Não passarão!
Seja qual for a fúria da agressão,
As forças que te querem jugular
Não poderão passar
Sobre a dor infinita desse não
Que a terra inteira ouviu
E repetiu:
Não passarão!

Miguel Torga - Poemas Ibéricos, 1965

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