segunda-feira, 3 de junho de 2013

Livro do Mês: O anacronista de Manuel António Pina

O ANACRONISTA DE MANUEL ANTÓNIO PINA
PORTO: AFRONTAMENTO, 1994

Este livro reúne dezenas de crónicas publicadas pelo autor no Jornal de Notícias, na Marie Claire e em O Jornal entre 1984 e 1993, crónicas às quais o autor deu uma arrumação temática.

Com esta obra Manuel António Pina foi galardoado em 1994 com o Prémio Nacional de Crónica Press Club / Clube de Jornalistas.

“As crónicas de Manuel António Pina, como qualquer leitor delas sabe, não são textos de um grande jornalista mas de um escritor, e de um grande escritor, ou do grande poeta que é o que prima fácies ele é. Se ele definia a sua poesia (…) como «saudade da prosa», as suas crónicas jornalísticas podem definir-se (…) como saudade da literatura. (…) é o singular fulgor literário dessa escrita que, qualquer que seja o assunto de cada crónica, resgata a generalidade delas da sua efemeridade ou passagem e faz que o seu passar seja «o seu essencial e contraditório modo de permanecer».”

Sousa Dias

Excerto da crónica “O gato não”

“Não há cronista que não se encontre um dia diante deste problema (se é que é um problema): não ter nada parecido com um assunto e ter a crónica à perna. Nessas alturas o cronista sente-se como um condenado no corredor da morte, com o «dead line» do jornal ou da revista ao fundo, a cada minuto que passa mais próximo e mais ameaçador. O truque é sempre o mesmo, a crónica sobre a falta de assunto, mas já nenhum leitor de crónicas cai nessa. Se a coisa acontece em Nova Iorque ou em Roma, às vezes, com um pouco de sorte, é possível sair de casa e dar com um assunto, ou chegar à janela e chamar, em desespero de causa, por um. Mas no Porto, e em Setembro…

Os cinemas passam filme inimagináveis (onde é que os exibidores vão desencantá-los, aos monos de Agosto e Setembro?); as galerias, às moscas mostram a pintura (tem que se chamar qualquer coisa àquilo) dos amigos e dos amigos dos amigos a quem andaram todo o ano a prometer e a adiar «uma exposição»; os livreiros arrumam estantes e montras e limpam o pó das edições em consignação, enquanto as novidades do Outono não começam a cair em catadupa; os emigrantes fazem as malas e partem, os veraneantes voltam e desfazem as malas, e a cidade abre a boca num imenso bocejo enquanto faz e desfaz malas.”

Leia, porque ler é um prazer!

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