Ondjaki, nome pelo qual é conhecido em todo o mundo o escritor angolano Ndalu de Almeida foi distinguido com o Prémio Bissaya Barreto de Literatura para a Infância 2012. O prémio distingue a obra infanto-juvenil A bicicleta que tinha bigodes pela “qualidade da história narrada, feita de recordações e vivências que podem facilmente prender a imaginação do leitor e transportá-lo para realidades diferentes da sua”. O júri destaca ainda “a riqueza do discurso que preserva marcas oralizantes e identitárias e permite aos leitores reconhecer a diversidade de registos na língua portuguesa”.
Onjaki nasceu em Luanda, em 1977. É licenciado em Sociologia e interessa-se pela representação teatral e pela pintura. Publicou o seu primeiro livro, Actu sanguíneu (poesia) em 2000.
A sua obra encontra-se traduzida para diversas línguas, entre elas francês, inglês, alemão, italiano, espanhol e chinês.
Em 2007 foi laureado com o Grande Prémio de Conto Camilo Castelo Branco pelo seu livro Os da Minha Rua, em 2008 recebeu o prémio Grinzane (Etiópia) por melhor escritor Africano e em 2010 ganhou o Prémio Jabuti (Brasil), na categoria Juvenil com o romance Avó Dezanove e o Segredo do Soviético .
O seu livro mais recente é A bicicleta que tinha bigodes publicado pela Caminho em 2011, agora premiado.
Excerto de A bicicleta que tinha bigodes
“Na minha rua vive o tio Rui, que é escritor e inventa estórias e poemas que até chegam a outros países muito internacionais.
O CamaradaMudo, um senhor gordo que fala pouco e está sempre sentado na esquina da nossa rua, disse que essas estórias já foram transformadas em peças de teatro num país com nome comprido, parece que se diz "Julgoeslávia".
Quando ouvi a notícia na rádio, que iam dar uma bicicleta bem bonita, amarela, vermelha e preta, lembrei-me logo de falar com o tio Rui. Era um concurso nacional com primeiro prémio de uma bicicleta colorida que já apareceu na televisão, mas nesse dia na nossa rua não havia luz.
De noite, a falar com a minha almofada, eu até já prometi bem as coisas: “se eu ganhar a bicicleta colorida, vou deixar todos da minha rua andarem sem pedir nada, nem gelados nem xuínga.”
Essa promessa assim bem dura de fazer é que me fazia acreditar que eu ia mesmo ganhar a bicicleta.
Mas eu não tenho jeito nenhum para essa coisa das estórias. Falei com outros miúdos, para saber quem tinha ideias, quem queria participar no concurso nacional da bicicleta colorida, mas todos me gozam a dizer que essa bicicleta já deve ter dono, que já sabem quem é que vai ganhar.
Não entendi aquilo, mas não desisti. Fui ainda falar com o CamaradaMudo.
– É verdade que essa bicicleta que estão a anunciar na rádio não é de verdade?
– Claro que é de verdade – o CamaradaMudo respondeu. – Tu tens uma boa estória?
– Eu só tenho uma boa vontade de ganhar essa bicicleta.
– Mas para ganhares tens de inventar uma estória.
– Tou masé a pensar que devíamos pedir patrocínio no tio Rui, aquele que escreve bué de poemas.
– Isso não é batota?
– Batota porquê?
– E as outras crianças?
– Quero lá saber, não tenho culpa que o tio Rui vive aqui na minha rua. Eles que descubram também o escritor da rua deles.”
O CamaradaMudo, um senhor gordo que fala pouco e está sempre sentado na esquina da nossa rua, disse que essas estórias já foram transformadas em peças de teatro num país com nome comprido, parece que se diz "Julgoeslávia".
Quando ouvi a notícia na rádio, que iam dar uma bicicleta bem bonita, amarela, vermelha e preta, lembrei-me logo de falar com o tio Rui. Era um concurso nacional com primeiro prémio de uma bicicleta colorida que já apareceu na televisão, mas nesse dia na nossa rua não havia luz.
De noite, a falar com a minha almofada, eu até já prometi bem as coisas: “se eu ganhar a bicicleta colorida, vou deixar todos da minha rua andarem sem pedir nada, nem gelados nem xuínga.”
Essa promessa assim bem dura de fazer é que me fazia acreditar que eu ia mesmo ganhar a bicicleta.
Mas eu não tenho jeito nenhum para essa coisa das estórias. Falei com outros miúdos, para saber quem tinha ideias, quem queria participar no concurso nacional da bicicleta colorida, mas todos me gozam a dizer que essa bicicleta já deve ter dono, que já sabem quem é que vai ganhar.
Não entendi aquilo, mas não desisti. Fui ainda falar com o CamaradaMudo.
– É verdade que essa bicicleta que estão a anunciar na rádio não é de verdade?
– Claro que é de verdade – o CamaradaMudo respondeu. – Tu tens uma boa estória?
– Eu só tenho uma boa vontade de ganhar essa bicicleta.
– Mas para ganhares tens de inventar uma estória.
– Tou masé a pensar que devíamos pedir patrocínio no tio Rui, aquele que escreve bué de poemas.
– Isso não é batota?
– Batota porquê?
– E as outras crianças?
– Quero lá saber, não tenho culpa que o tio Rui vive aqui na minha rua. Eles que descubram também o escritor da rua deles.”
Obras do escritor disponíveis na rede de Bibliotecas do Concelho de Arganil
• Quantas madrugadas tem a noite. Lisboa : Caminho, 2010.
• A enfermeira de bata negra. Porto : Campo das Letras, 2003. ISBN 972-610-730-X
• Ynari : a menina das cinco tranças. Lisboa : Caminho, 2004. ISBN 972-21-1636-3
• O assobiador ; Há prendisajens com o xão. Lisboa : Caminho, 2009.
• E se amanhã o medo : contos. Lisboa : Caminho, 2005. ISBN 972-21-1708-4
• O voo do golfinho. 1ª ed. Lisboa : Texto, 2011. ISBN 978-111-11-2861-6
• Os olhos grandes da princesa pequenina. 1ª ed. Lisboa : Texto, 2011. ISBN 978-111-11-2859-3
• O leão e o coelho saltitão. [Lisboa] : Caminho, imp. 2008. ISBN 978-972-21-2011-1
• Os da minha rua. Lisboa, 2007. ISBN 978-972-21-1863-7
• Momentos de aqui. Lisboa, 2007. ISBN 978-972-21-1407-3
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